segunda-feira, 28 de outubro de 2013

“Eu não tenho amigos!”

Por Antunes Ferreira
“Ó SR. DEPUTADO, eu não tenho amigos!”,  afirmou Pedro Passos  Coelho, em resposta a Jerónimo de Sousa. “Não admira!”, exclamou de imediato o líder da bancada comunista, num aparte bem audível no plenário. E a oposição rompeu em gargalhadas, o que motivou que Coelho corrigisse logo a seguir, “Eu não tenho amigos… no Banif”. Assim respondia ao secretário-geral do PCP que afirmara que o (des)Governo só tinha mãos largas para os amigos. Referia-se ao estranho caso do BPN. E perguntou ainda se estava “em condições de garantir que os portugueses não vão ser chamados a pagar outro BPN no caso do Banif”.
Coelho não gostou da pergunta do líder do PCP. Mas nos minutos que tinha para responder a Jerónimo o chefe do Governo acabou por não dizer se o Banif já liquidara ou não as tranches das ajudas estatais que recebeu. Teve de esperar até ao final do debate para, com um papel na mão, dizer que o Banif “já devolveu 150 milhões de euros com o primeiro reforço de capital que foi realizado”.
A sessão par(a)lamentar de quarta-feira foi um tremendo desastre para o nosso primeiro. Se quisermos sintetiza-la numa curta frase não será difícil: foi um circo. Com Passos sem compasso como palhaço aparentando ser rico, mas no fundo sendo pobre. De espírito. Os deputados da coligação espúria aplaudiram-no, defenderam-no, mas, pouco, com convicção alegro ma non tropo. Os da oposição riram-se – e não tiveram pena dele. Nem tinham de ter.
João Semedo já o “incomodara”; ou seja, a oposição toureava-o e naturalmente a pseudo serenidade de Passos foi-se esbatendo, chegando ao ponto de ruptura do verniz com que tenta disfarçar as mentiras que diz aos Portugueses. Encostado às cordas sobra-lhe em irritação o que tenta passar de calma e tranquilidade a quem todos os dias é roubado por ele próprio ou pelos seus capangas.
Erro pornográfico
Na sua edição on-line de quinta-feira, como habitualmente, o Expresso publica a coluna Politicoesfera assinada pelo seu titular João Lemos Esteves. Com este não estou de acordo por diversas vezes; mas o seu texto merece-me um aplauso, de tal forma que, se mo permitisse a minha cabeça (e o meu teclado) não teria pejo de o assinar na totalidade. Mas, assim, limito-me a transcrever dois passos dele.
“João Semedo afirmou, ontem no debate parlamentar, que não sabe se o Governo ainda tem tropas - mas certamente já não tem generais. Pois bem, acrescento que o general Passos Coelho nunca existiu e já está praticamente deposto - e as tropas, face à inexistência política absoluta do general (e inexistência, como se sabe, é mais grave do que nulidade política), as tropas - e as melhores tropas - de Portugal continuam a desertar.
(…)

Passos Coelho cometeu um erro pornográfico: afirmou que o Orçamento de Estado para o próximo ano comporta vários riscos. Portanto, já não bastava que o OE tivesse sido elaborado a trouxe-mouxe , nos últimos dias legalmente previstos para a sua apresentação; já não bastava as indefinições e o défice de esclarecimento sobre algumas medidas pré-anunciadas do Orçamento - ontem, Passos Coelho confessou a sua impotência para executar o Orçamento! Já não é um problema da troika. Já não é um problema de gestão política do executivo e a nossa dependência face ao exterior: é um problema de incompetência exclusiva do Governo, pois é o único órgão que tem poderes para aplicar o Orçamento de Estado e garantir a sua aplicação!”
(O destaque em negro é do autor, a quem felicito pelo artigo.
Aliás, aproveito esta oportunidade para referir que parte deste comentário é respigada do “Público” e de outros órgãos da comunicação social. A todos, o meu obrigado)

Entretanto, António José Seguro também entrou na dança. Não falou em eleições, mas não deixou de insinuar a necessidade de chamar os portugueses às urnas caso o país recorra a um segundo pedido de ajuda. O que também irritou Coelho que, na reposta, recusou debater "clichés". E porquê? Porque o líder socialista acusou o (des)Governo de chamar "programa cautelar" ao que na prática não passa de um "segundo resgate". Seguro notou que "existem quatro formas de regressar aos mercados e só uma delas é independente e dispensa condicionalidades".
Seguro frisou que "se houver um segundo pedido de ajuda", Passos deverá "tirar consequências" e não terá "perdão" porque significa que "o programa falhou". Com o semblante carregado, Passos considerou que "é lamentável que o PS pense em confundir os portugueses". E renovou o desafio ao líder dos socialistas: "No dia em que quiser fechar o nosso programa sem populismo e sem demagogia, eu estou disponível para fazer uma discussão séria”. Por isso, a comunicação social considerou que o frente-a-frente entre Passos e Seguro foi o momento mais quente do debate quinzenal.
A dado passo da sua intervenção, Seguro recordou as afirmações do "ministro do CDS" (Pires de Lima, em Londres, sobre o programa cautelar que já estaria a ser preparado). Passos corrigiu: "não é um ministro do CDS. É um ministro do meu Governo". E até garantiu que a preparação de um programa cautelar não estava na sua mesa, nem na da ministra das Finanças, nem na mesa das negociações com a troika. Foi uma tentativa desesperada de interpretar “As pombinhas da Catrina”. Cruxificado, ainda assumiu pateticamente do cimo do Calvário de São Bento que está a aguardar o fim do programa na Irlanda para decidir como é que Portugal vai ter assistência no regresso aos mercados. Além de não saber – confessou-o – qual será o futuro da economia, está à espera de ver em que param as modas. Irlandesas.
Foi assim, com esta afirmação – que deve ser lida segundo o ditado “quem espera sempre alcança”? – que Coelho deixou uma vez mais no ar a irresponsabilidade de um (des)Governo de putos mal preparados (e mal educados) quando dizem que não foram eles que tinham ido à lata dos biscoitos que a mãe tinha usado para impedir, em vão, o furto desses bolos secos. Porque o roubo que acontece quotidianamente não é de biscoitos. É daquilo com um cidadão em primeiro lugar usa para se alimentar a si e aos seus: dinheiro. Por isso estão muitos Portugueses a morrer de fome.

NA – A expressão (des)Governo é de minha responsabilidade